24 de jul. de 2011

O que não se pode evitar

Começamos assim: você brincando de gostar de mim e eu brincando de acreditar.

Acredito que quase imediatamente tenha te chocado com alguma das minhas frases, ou com o carinho que lhe atribuía. Logo você falou sobre não se envolver, então ríamos alto dos casais em volta e nos gabávamos da auto-suficiência amorosa que tanto tentamos provar pro outro. E eu sei que o teu motivo está preso no passado e tive vergonha de te contar tudo o que sei que sei sobre você. Você sofreu. Você sofreu e culpou todas as mulheres pelo erro de uma. Sei e me compadeço da tua experiência.

Então nos oferecemos companhia. Uma madrugada tive fome e você apareceu na minha porta “sanduíche de queijo branco?”. Nem muitos assuntos tínhamos, nos faltavam coisas em comum. Criamos um jeito novo de nos relacionar, monossilabicamente excitante. Passávamos bastante tempo juntos, falávamos sobre uma infinidade de assuntos e eu tinha a impressão de não estarmos dizendo nada um ao outro. O que fazíamos em todo aquele tempo juntos já que não estávamos nos conhecendo?

Mas você não me cobrava. E em troca eu não te cobrava. Eu não te dizia palavras bonitas da boca pra fora e você não fazia por mim aqueles gestos grandiosos que tanto quis de outrem… Só o espontâneo, algo quase sempre tangendo o trivial. Gostei de você por isso, pela franqueza das tuas limitações. E você gostou de mim pelo excesso de compreensão. E todas as noites antes de dormir podia encostar minha cabeça no teu peito.

Na primeira noite eu não dormi. Já te disse? Fiquei quietinha, olhando você sonhar e me perguntando se estaria prestes a me envolver só porque havíamos combinado o contrário. E, pelo simples fato de essa pergunta ter existido mesmo que por um segundo dentro da minha cabeça, significa que eu nunca realmente cumpri o pré-requisito. Preciso pedir desculpas por isso? Você é tão bonito dormindo… Eu filmei! Gravei cada sopro de respiração e quando sinto tua falta recorro às imagens arquivadas na memória. “Tão bonito”.
Durante uma de nossas conversas, deitados, enquanto encarávamos o teto sob nossos corpos cansados, você resmungou “o que foi, meu ammm…?!”. Tua cicatriz assassinou o adjetivo antes mesmo de seu fim, mas levou consigo qualquer sentido antes implícito. Tive medo de que você não estivesse pronto para essa pronúncia, respirei fundo e fiz cara de quem escutou “O que foi, pequena?”.

Você me convidou pra viajar até a sua nova casa, eu disse “você vai ficar bem”. Fazendo charme você pediu “vai me ver?” e, sem saber se encarava como uma brincadeira, respondi “relaxa, você vai ficar bem”. Você se despediu “estou indo” e eu ofereci “vou até lá te ver”, você riu. Eu reiterei a oferta como quem busca persuasão “mas eu vou mesmo te ver” e te vi rindo novamente, envergonhado. Você me fez achar graça em mim mesma. Acho que quebrei a única regra que já tivemos.

Mas você não me cobra e eu nao te cobro.
Acho que começamos assim: você gostando de mim em tom de brincadeira, como quem precisa muito ser levado a sério e eu querendo mesmo que fosse tudo verdade… Admito!

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